Poema histérico

Eu não sou histérica

Histérico é o seu olhar reprovador

Histérico é a sua conduta cerceadora e pautada no mundo das aparências

Histérico é o comportamento histórico de homens que subjugam a opinião feminina

Histérico é a sua insensibilidade em ouvir e acolher uma necessidade

O problema não está no meu útero

Está na forma como vocês rotularam nossos úteros

Como se eles fossem causadores de escândalos

E não os seus atos dissimulados e sórdidos

Assim, milhares de mulheres foram queimadas

Rotuladas de histéricas por defenderem a si mesmas

Por defenderem o direito de existir, ser, sentir, agir e pensar

Não são nossos úteros os perturbados

São as mentes limitadas é que perturbam a paz, o respeito e o amor

Não, senhorito, não vou falar mais baixo porque você teme o que pensarão os vizinhos

Não, senhorito, não vou mudar minha reação porque você a provocou

Não, senhorito, não há nada de errado em reagir a disparates

Não, senhorito, não foi por nada e nunca será

Não, senhorito, o sangue de meu útero não subiu à minha cabeça

É você quem não honra o chão sob seus pés

É você quem tem sangue nos olhos e me vê como histérica.

Desde que nascemos, disfarçados em bordados fofos e manto cor-de-rosa, embutem-nos os espetos todos

Nosso sangue é todo mês.

Nosso sangue nos faz bem

Nosso sangue nos renova e nos torna anciãs a cada ciclo

Liberte-se enquanto há tempo,

Pois meu fluxo segue

a honrar todas as mulheres que vieram antes de mim

E com ele seguirei, livre de seus julgamentos histéricos.

Texto e imagem filtrada de Cecília Gomes em 1º de dezembro de 2020, após indigesto processamento de reflexões ao ouvir a frase: "Fale baixo. Não precisa ser histérica".